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domingo, 28 de junho de 2020

Segurança Pública: a proposta da Polícia Comunitária


Segurança Pública: a proposta da Polícia Comunitária


Presente em vários países, ela seria gerida pelos municípios, mas com controle popular, valor tão importante quanto a desmilitarização. Sem burocracia, suas ações seriam preventivas e sintonizada aos problemas da população
OUTRASPALAVRAS

Publicado 06/02/2020 às 20:24 - Atualizado 06/02/2020 às 20:31
Polícia inglesa segue modelo comunitário. França, Itália, Bélgica e Alemanha seguem o mesmo caminho

A PEC-51, também conhecida como a “PEC da desmilitarização”, traz uma grande reforma constitucional de todo o sistema de segurança pública brasileiro, principalmente na organização das polícias, ao instaurar no país um modelo de policiamento comunitário, de ciclo completo e com carreira única. Para além desses principais pontos, porém, o projeto toca em outros pontos importantes para esta reforma, como o controle social sobre a polícia e a municipalização da segurança, bem como o papel da União na pasta. O trecho a seguir é parte de um artigo publicado em 20171, por mim, na Revista Brasileira de Ciências Criminais, onde abordo estes últimos pontos:

Além das mudanças institucionais que a PEC-51 prevê, como a desmilitarização e a imposição do ciclo completo e da carreira única nas polícias, outras alterações no Texto Constitucional são ventiladas pelo projeto, principalmente no que tange às competências dos entes federativos. Isso porque, em matéria de segurança pública, no modelo atual, existe uma grande concentração de poder decisório e organizacional nos Estados, restando poucas competências à União e aos Municípios.

No tocante à União, a proposta traz uma nova perspectiva para a segurança pública em âmbito nacional, conferindo novas competências ao ente federativo que passaria a ter papel fundamental na formação de princípios e diretrizes que norteariam a estruturação dos órgãos de segurança pública, desde a formação de seus profissionais até a gestão de tais instituições. Importante ressaltar, porém, que a organização das polícias estaduais, ainda assim, competiria aos Estados, que deveriam apenas pautar-se nos parâmetros estabelecidos em âmbito nacional para tanto.

Estas principais diretrizes, que pela proposta seriam incorporadas à Constituição de forma expressa, seriam a atuação isonômica em relação a todos os cidadãos, a valorização de estratégias de prevenção do crime e da violência, a valorização dos profissionais de segurança pública, a garantia de funcionamento de mecanismos de controle social e de promoção da transparência e a prevenção e a fiscalização efetivas de abusos e ilícitos cometidos por profissionais de segurança pública. Deve-se acrescentar, ainda, a tais princípios e diretrizes, a desmilitarização, o ciclo completo e a carreira única.


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A proposta vai no sentido do que ensina Sergio Adorno2 ao afirmar que a formulação de diretrizes nacionais para a condução das políticas públicas deve caber ao governo federal. No entanto, no que tange à ordem pública civil, no Brasil, tal responsabilidade é do governo estadual, que dispõe de certa autonomia para formular diretrizes e comandar as polícias civil e militar. Ao governo federal, resta a intervenção em casos de grave ameaça à segurança pública, desde que solicitada pelo governo estadual.

Segundo o autor, porém, as mudanças dos padrões convencionais de crime e delinquência, cada vez mais internacionalizados em um contexto de economia global, exigem maior responsabilidade da União na área de segurança pública.

De forma semelhante, Luiz Eduardo Soares3 considera que, no atual sistema de segurança pública, a União tem responsabilidades muito parcas, tais como a organização das três polícias federais e a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). Esta última, aliás, possui uma série de responsabilidades que não tem capacidade de cumprir por não dispor de autoridade, poder e recursos para tanto.

Deve-se ressaltar, porém, que o empoderamento da União na área de segurança pública não implica na criação de um único processo que subordine os demais entes federativos a um modelo criado em caráter nacional. Na verdade, remete à criação de uma política nacional formuladora de diretrizes e princípios que auxiliem os outros entes federativos nas articulações e distribuições de trabalho aplicadas na formação das instituições policiais.

Além disso, a proposta de emenda à Magna Carta objetiva o aumento do poder dos Municípios na gestão da segurança pública, vez que possibilita a criação de polícias municipais subordinadas à Prefeitura, ou a conversão das já existentes guardas municipais nestas, desde que obedecidos os parâmetros estabelecidos nacionalmente.

Atualmente, o Texto Constitucional4 dispõe que os Municípios têm competência na gestão securitária somente para constituir guardas municipais cujas funções sejam de proteger seus bens, serviços e instalações. Tais funções, porém, pouco tem a ver com a questão da segurança pública, o que denota a baixa capacidade de interferir nesta área por parte dos Municípios.

Nesse sentido, Luiz Eduardo Soares5 aponta que o baixo empoderamento do Município na questão da segurança pública contrasta com outras áreas da administração, como saúde e educação, nas quais o ente federativo tem importância crescente. Na área de segurança, porém, cabe ao Município a possibilidade de criar guardas municipais apenas.

A demanda e a insatisfação da população, porém, exercem uma pressão nas diversas prefeituras, de modo que as guardas, que têm a função de vigiar e proteger patrimônios municipais, sofrem um desvio de finalidade e, transformadas em pequenas polícias militares, reproduzem os mesmos vícios destas instituições. Isto ocorre por conta da ausência de uma política nacional que regule e coordene a criação delas.

Além disso, interessante análise faz Maria Eugênio Telles6 ao ressaltar que, devido às próprias dificuldades do serviço policial, este deve estar sob controle permanente de seus usuários. A efetividade desse controle, porém, depende do acesso que a população tem à esfera de poder à qual a instituição é subordinada, que só é direto no âmbito municipal. Por esse motivo, o artigo 30, inciso I, da Constituição Federal, que atribui aos Municípios a competência para legislar sobre assuntos de interesse local, deveria aplicar-se também à segurança pública.

A verdadeira polícia comunitária, desse modo, seria a municipal, devido à escala e à abrangência que possibilitam maior transparência e uma maior fiscalização por parte da própria população. Este conceito é muito semelhante a outro já implantado no país, em São Paulo, no ano de 1926, quando fora criada a Guarda Civil, uniformizada e sujeita à hierarquia e disciplina, mas sem quartéis, aos moldes da polícia inglesa, desempenhando funções preventivo-ostensivas.

Por isso, para a autora, a descentralização da polícia preventivo-ostensiva é uma forma de combater a burocracia que põe a perder a administração do serviço policial, hoje caracterizado pelo autoritarismo, desperdício e ineficiência, o que onera o orçamento e dificulta o combate à corrupção.

De forma semelhante, Theodomiro Dias Neto7 ressalta a importância da administração municipal ao analisar experiências em diversos países que comprovam o potencial do Município como força motriz de transformações para a resolução de problemas, mesmo os de ordem global como o desemprego ou a destruição ambiental. Isso porque, ao enxergar a cidade como o espaço onde os problemas se manifestam e exercem influência mais direta na vida das pessoas, percebe-se seu potencial para ser o ponto de partida de mobilizações políticas que tratem das consequências sociais destes em busca de soluções.

Por isso a municipalização da segurança pública se mostra uma tendência mundial, como se observa no policiamento comunitário inglês, no qual a polícia funciona como coordenadora de ações locais de prevenção. França, Itália, Bélgica e Alemanha também seguem o mesmo caminho, vez que seus governos municipais assumem o papel de coordenadores de ações de prevenção através de um conceito conhecido como prevenção comunal. No caso alemão, por exemplo, os Conselhos de Prevenção têm a tarefa de integrar competências diversas através da criação de grupos de trabalho voltados a coordenação de ações preventivas em questões problemáticas ligadas à criminalidade.

E mesmo a América Latina, ainda que de forma tímida, começa a seguir essa tendência, conforme analisa Luis Salas8. Para o autor, nos anos 90, houve uma onda de descentralização dos governos no continente que transferiu uma série de funções aos governos locais. A transferência dos deveres da polícia aos municípios seria, assim, uma possível consequência deste processo, já observada em países como Brasil, Argentina, Costa Rica e México que, por apresentarem um modelo mais descentralizado, possuem uma multiplicidade de unidades policiais.

Assim, o empoderamento municipal na área de segurança pública, aventado pela PEC-51, segue uma tendência mundial e objetiva a implantação do conceito de polícia comunitária, bem como a aproximação de tais instituições à população local, possibilitando a implantação de políticas públicas de segurança mais eficazes. Importante ressaltar que a extensão destas competências ao Município não implica, porém, em retirar do Estado a competência para organização das polícias estaduais, sempre pautadas nas novas diretrizes nacionais de segurança pública.

Por fim, outro aspecto importante da PEC-51 é a criação de ouvidorias externas e independentes da polícia, no âmbito de cada órgão policial, dotadas de autonomia orçamentária e funcional. Entre suas incumbências, que seriam garantidas constitucionalmente, elas teriam competência regulamentar, tais como dispor sobre procedimentos de atuação policial, suspender a execução de procedimentos inadequados e avaliar e monitorar suas atividades. Também teriam competência disciplinar para receber e processar reclamações e denúncias de abusos cometidos por policiais, podendo até mesmo decidir pela demissão do cargo.

Junto com a municipalização, a criação de ouvidorias externas com poder disciplinar e que zelem pelos princípios básicos que constituem uma polícia comunitária é uma forma de garantir o controle popular sobre as instituições policiais, coibindo possíveis abusos de poder e desvios de finalidade desses agentes estatais.

Desse modo, resta claro que a PEC-51 visa não somente uma reforma meramente institucional dos órgãos policiais do país, mas também uma mudança na cultura de combate à criminalidade de modo que as políticas de segurança pública se pautem em valores democráticos como a participação popular, a descentralização do poder e o respeito aos direitos humanos.

1 FELITTE, Almir Valente. Desmilitarização das polícias: considerações sobre a PEC-51 e a reforma do sistema de segurança pública brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 130. ano 25. p. 23-45. São Paulo: Ed. RT, abr. 2017.

2 ADORNO, S. Políticas públicas de segurança e justiça penal. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, Segurança Pública, Fundação Konrad Adenauer, n. 4, 2009. p. 9-27.

3 SOARES, op. cit.

4 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 09 nov 2016.

5 SOARES, op. cit.

6 TELLES, op. cit.

7 DIAS NETO, T. Segurança urbana: o modelo da nova prevenção. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais; Fundação Getúlio Vargas, 2005. p. 131-132.

8 SALAS, L. P. Justiça Penal na América Latina: reformas e desafios. In: Segurança pública como tarefa do Estado e sociedade. São Paulo: Fund. Konrad-Adenauer-Stiftung; Centro de Estudos, 1998. p. 39-85.

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