Bloqueador prometido de novo
Em meio à crise no sistema prisional de Goiás, agravada com a divulgação de regalias e facilidades dos detentos para cometerem crimes e com a exoneração do titular da área, o governo do Estado anunciou, ontem, mais uma vez, que vai adquirir bloqueadores de celular para instalar no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia. Pelo menos desde 2011 vem sendo divulgada a promessa do uso dos equipamentos tanto Penitenciária Odenir Guimarães (POG) como na Casa de Prisão Provisória (CPP), localizados no complexo prisional, de forma a coibir a ação dos criminosos e a crescente onda de crimes em Goiás, praticados com supostas ordens de detentos.
A repercussão nacional da precariedade do sistema prisional do Estado fez o governador Marconi Perillo (PSDB) exonerar o secretário de Administração Penitenciária e Justiça, Edemundo Dias de Oliveira Filho, e o superintendente da pasta, Antônio Carlos de Lima, conforme divulgou ontem O POPULAR. O tucano nomeou o titular da Secretaria de Segurança Pública (SSP), Joaquim Mesquita, e o superintendente-executivo da SSP, coronel Edson Costa de Araújo, para acumular as funções, interinamente. O programa Fantástico, da Rede Globo, mostrou domingo as regalias de presos na POG.
Durante assinatura do contrato do Centro de Referência e Excelência em Dependência Química (Credeq) de Aparecida de Goiânia, Marconi explicou ontem sua aposta no novo nome. “O secretário Joaquim assume com a incumbência provisória de levantar as falhas e as medidas que precisam ser adotadas, como a instalação de bloqueadores de celulares no presídio de Aparecida. A outra é a conclusão do processo e aquisição de mais tornozeleiras eletrônicas”, acentuou o governador, durante o evento, no Palácio Pedro Ludovico Teixeira.
O governo do Estado voltou a prometer que vai comprar um bloqueador móvel (maleta portátil), com tecnologia israelense, ao custo de R$ 2 milhões, e bloqueadores fixos. Ainda em 2011, a administração penitenciária informou que os equipamentos seriam instalados na CPP e na POG. Em outubro de 2012, Edemundo Dias repetiu a promessa, informando que o equipamento portátil seria instalado três meses depois, o que não ocorreu.
Gastos
No início de 2012, o Estado gastou R$ 80 mil com bloqueadores fixos de celular instalados na POG, CPP e no Núcleo de Custódia, mas os equipamentos não conseguiram impedir as ligações dos condenados com pessoas do lado de fora do presídio, já que não captavam o sinal dos celulares. A pasta alegou que precisava investir em bloqueadores mais potentes.
A aquisição do bloqueador portátil está em análise na Junta de Programação Orçamentária e Financeira (Jupof), da Secretaria de Gestão e Planejamento (Segplan), que deve autorizar a licitação. Os recursos são do repasse feito pelo Fundo do Judiciário à SSP. Já os bloqueadores fixos serão instalados no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia e o recurso sairá de parte dos R$ 25 milhões que o Estado solicitou ao Fundo do Judiciário. O dinheiro também deverá ser investido na aquisição de outros equipamentos, como coletes e capacetes de segurança.
As empresas que oferecem bloqueadores fixos terão de fazer um mapeamento no complexo, para, depois, apresentarem o custo e a quantidade de equipamentos necessários. A compra será feita por meio do regime diferenciado de contratação, o mesmo usado pelo governo federal para as obras de construção dos estádios da Copa do Mundo.
Poder dos presos
O celular tem sido o principal meio de contato dos detentos com o mundo externo, como mostram inúmeras operações da Polícia Civil e do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) deflagradas nos últimos anos. Em janeiro, presos da POG ligaram para a redação do POPULAR e contaram como comandam lá de dentro diversos crimes, como homicídio, roubos e furtos.
Em fevereiro, o MP-GO deflagrou a Operação Avalanche e prendeu 22 integrantes de uma quadrilha especializada no tráfico de drogas. O grupo, que agia no Nordeste do Estado e no Distrito Federal, era comandado por um detento da POG. Mas este foi apenas um dos diversos casos desvendados dentro do sistema prisional goiano.
Em julho de 2013, líderes de uma das maiores quadrilhas de roubo de carros e tráfico de drogas já identificada no Estado - com ramificações internacionais - foram presos por policiais da Delegacia Estadual de Furtos e Roubos de Veículos Automotores (DEFRVA). Das 14 pessoas detidas, 7 tiveram os mandados de prisão cumpridos dentro do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia. Era de lá que os chefes davam ordens para roubo de veículos, clonagem (uma maneira de “esquentar” os documentos) e para que eles fossem levados ao Paraguai, onde eram trocados por drogas, principalmente cocaína e maconha.
Mesquita toma posse hoje na Sapejus
O titular da Secretaria de Segurança Pública (SSP), Joaquim Mesquita, e o superintendente-executivo da pasta, coronel Edson Costa de Araújo, devem assumir hoje, oficialmente, os postos na Secretaria de Administração Penitenciária e Justiça (Sapejus). As funções serão acumuladas.
O ex-titular da Sapejus, Edemundo Dias de Oliveira Filho, deve continuar se reunindo com Joaquim Mesquita, como fez na noite de segunda-feira, depois de ser exonerado pelo governador Marconi Perillo. O delegado Antônio Carlos de Lima também foi exonerado da Superintendência-executiva da Sapejus.
A onda de homicídios pautou o encontro de Edemundo Dias e Joaquim Mesquita, na casa do ex-prefeito de Goiânia Nion Albernaz. “A reunião foi para buscar solução para resolver o problema dos homicídios”, contou Nion. “Como o problema é muito complexo, deixamos para a próxima reunião tentar ver se identificamos soluções”, emendou.
Depois do encontro, Edemundo e Nion conversaram, por telefone. “Ele apenas disse que o governador não o ouviu, para dar as explicações dele”, relatou o ex-prefeito de Goiânia.
Em coletiva à imprensa, o governador Marconi Perillo (PSDB) apresentou outra versão. “Foram mostradas algumas cenas e falhas no sistema e chegamos à conclusão, eu e ele, de que era hora de fazer uma substituição”, ponderou o tucano, referindo-se às imagens exibidas domingo na reportagem do programa Fantástico, da Rede Globo.
Tensão entre diretores dos presídios
A troca de nomes na Secretaria de Administração Penitenciária e Justiça (Sapejus) provocou tensão entre os diretores da Penitenciária Odenir Guimarães (POG) e da Casa de Prisão Provisória (CPP), no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, na região metropolitana da capital. É o que relataram ontem agentes de segurança prisional, ao POPULAR. “Os diretores das unidades prisionais estão com muito medo de serem trocados, também”, contou um agente.
As diversas regalias concedidas aos presos, principalmente aos chefes de ala, também são de conhecimento dos diretores, de acordo com os agentes. “Os diretores são cúmplices. Também sabiam de tudo e, agora, estão com medo de cair”, afirmou um deles. “Se houve mudança no topo, corre o risco de mudar os subordinados”, emendou.
Uma agente de segurança prisional contou que as revistas voltaram a ser mais severas, depois de ser divulgada a queda de Edemundo Dias. “Hoje (ontem) até estranhei quando cheguei para trabalhar. Os outros agentes estavam abrindo tudo, abrindo bolsa e passando detector de metal. O certo é fazer isso com todo servidor que for entrar no presídio, o que não estava sendo feito”, afirmou ela, para ironizar: “O padrão lá estava cinco estrelas hoje (ontem).”
Entre os presos, o clima era de silêncio. “Foi dado toque de silêncio. Ninguém comenta nada, mas muitos estão apreensivos”, contou outro agente. “No dia a dia, os detentos fingem que estão presos, os agentes fingem que vigiam e a população acredita”, criticou ele, acrescentando que até o dono de um consultório particular, instalado dentro da POG, está com medo de ser retirado do local.
Apesar da mudança, a perspectiva é de muito ceticismo. “Na verdade, não vai acontecer muita mudança mais. Só mudou o alto escalão. O Joaquim Mesquita não vai encarar de cabeça erguida. Aquilo é uma bomba perto de estourar. Ele não vai mudar de jeito nenhum”, destacou um agente prisional.
O POPULAR tentou ouvir Joaquim Mesquita, mas não conseguiu. A reportagem também não conseguiu ouvir os diretores das unidades.
Fonte: Jornal O Popular