Bolsonaro planeja turbinar Bolsa Família de olho na popularidade para 2022
Presidente faz da transferência de renda sua principal cartada — programas desse tipo alavancaram FH Lula e Dilma.
Presidente Jair Bolsonaro (Foto: Anderson Riedel/PR)
Com a imagem do governo arranhada pelo atraso da vacinação, que causa impactos sanitários e econômicos, e pela CPI da Covid no Senado, o presidente Jair Bolsonaro aposta no incremento de benefícios sociais, receita que gerou ganhos de popularidade em governos anteriores, e planeja turbinar o Bolsa Família para que o programa passe de 14 milhões de famílias atendidas para 20 milhões até o fim do ano.
Antes crítico ferrenho do programa, criado e expandido com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a partir da união de programas do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Bolsonaro agora pressiona também para engordar o valor médio em cerca de 50%, chegando perto de R$ 300 mensais por família às vésperas da disputa pela reeleição em 2022.
Levantamento feito pelo GLOBO mostra cinco momentos deste século em que a criação ou o incremento expressivo de programas de transferência de renda por parte do governo federal coincidiu com aumento de popularidade do presidente. Foi assim com FH, quando criou o Bolsa Escola, e em três períodos das administrações de Lula e Dilma Rousseff (PT). No ano passado, Bolsonaro experimentou o mesmo crescimento na avaliação de ótimo e bom nas pesquisas de opinião pública ao criar o auxílio emergencial de R$ 600 e repassá-lo para 68,2 milhões de brasileiros.
Marca própria
Para imprimir uma marca própria de Bolsonaro na área social e afastar referências ao PT, o Bolsa Família deve ganhar um novo nome. Depois de tentativas de chamar o programa de Renda Brasil e Renda Cidadã serem deixadas de lado, aliados e integrantes do governo cogitam agora nomeá-lo de Alimenta Brasil.
A ideia é combinar outros benefícios ao Bolsa Família, como novas versões do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do auxílio-creche, para que algumas famílias recebam valores de até R$ 600, mesmo patamar da versão original do auxílio emergencial, que durou apenas quatro meses. A equipe técnica do Ministério da Cidadania, que tenta viabilizar o início do programa em outubro, trabalha com projeções que devem deixar o valor médio em torno de R$ 250.
— Quando Lula lançou o Bolsa Família combinado a outras políticas sociais importantes, como a valorização do salário mínimo, ele estendeu sua influência política especialmente no eleitorado do Nordeste, que antes votava muito em políticos conservadores, e desde então passou a votar majoritariamente no PT — lembra o economista Bruno Carazza, professor do Ibmec e da Fundação Dom Cabral.
Carazza diz enxergar chance de uma nova guinada eleitoral nessa região do país, a depender dos contornos do novo programa e da capacidade de Bolsonaro de “capturá-lo” politicamente.
— A estratégia de mudar de nome mostra que se quer passar a ideia de um benefício perene. Ao contrário do momento atual, Bolsonaro tem uma perspectiva econômica melhor para o ano que vem, com folga fiscal pela inflação e possível boom de commodities — completa o economista.
Tanto FH quanto Lula lançaram mão de programas robustos de transferência de renda imediatamente após momentos turbulentos dos seus mandatos. O Bolsa-Escola foi instituído em abril de 2001, momento de forte queda da avaliação do tucano em meio ao racionamento de energia. No ano seguinte, o fim da crise energética e a expansão do benefício social, que chegou a cinco milhões de famílias, ajudaram a levar a popularidade de FH de 19% para 31%.
Já Lula, pressionado pelo escândalo do mensalão, em 2005, recuperou a avaliação positiva em paralelo à expansão do Bolsa Família, que deu um salto para 11 milhões de famílias no início de 2006, e ao avanço da economia com a menor inflação desde 1998. No espaço de um ano, o petista viu a aprovação ao seu governo saltar de 31% para 52%, de acordo com as pesquisas da época.
O ciclo positivo no segundo mandato de Lula, com rápida recuperação da crise mundial de 2008, permitiu nova ampliação do Bolsa Família já no governo Dilma. Além de ver a avaliação do governo melhorar quase 20 pontos entre 2011 e o início de 2013, beirando 70% de aprovação no Nordeste, Dilma registrou saltos de popularidade nas regiões Sul e Norte naquele momento.
Para o cientista político Antônio Lavareda, a “moldura eleitoral explícita” do novo programa pode limitar seu impacto para o presidente Bolsonaro:
— No governo FH, além do Bolsa-Escola, a criação do Cadastro Único foi um marco de política duradoura. O Bolsa Família representou um aumento de patamar de política social dentro de um ciclo econômico favorável — disse Lavareda, que continuou:
— No caso de Bolsonaro, é plausível que melhore a avaliação, mas para ter um resultado eleitoral consistente o programa precisa ser consolidado e simbolicamente associado ao presidente, tudo isso até abril ou junho — afirmou o cientista político.
Efeito sanfona
Atualmente, 14 milhões de famílias recebem o Bolsa Família, metade delas no Nordeste. Para chegar a 20 milhões, o programa precisa passar antes por votação no Congresso Nacional. Uma lei de 2020 impede a criação de despesas obrigatórias contínuas na pandemia. Lideranças políticas ouvidas pelo GLOBO preveem facilidade de aprovação das mudanças no Senado e na Câmara, já que tanto a oposição quanto a base aliada devem ser favoráveis.
Como a legislação eleitoral impede o pagamento de benefícios em 2022, exceto em casos de calamidade pública ou de programas autorizados em lei e já em execução orçamentária, o governo precisa aprovar a nova versão do Bolsa Família ainda neste ano. A ideia é incluir sua previsão no projeto do Orçamento de 2022, que vai ser encaminhado ao Congresso em agosto.
— O governo deve entregar até o fim do ano um novo programa robusto, com destaque para o perfil das famílias e o número de integrantes. Tudo isso à medida que conseguimos retomar a agenda de reformas e a economia começa a responder — disse o líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO).
Além disso, há a preocupação de evitar um vácuo entre o fim do auxílio emergencial e o início do novo programa. Neste ano, o benefício ficou quatro meses sem ser pago. Depois, houve uma retomada, mas com repasse de valores menores para uma quantidade inferior de pessoas. Enquanto a primeira leva custou R$ 231 bilhões, o equivalente a quase oito anos de Bolsa Família, a rodada iniciada em abril de 2021 prevê uma despesa 90% menor, de R$ 17 bilhões, e atingindo metade do público original do benefício.
Diante das idas e vindas com o pagamento do auxílio emergencial, Bolsonaro experimentou uma espécie de “efeito sanfona” nos seus números nas pesquisas. No auge do pagamento do benefício, entre agosto e dezembro do ano passado, o presidente chegou a alcançar índices de 37% de aprovação ao seu governo, segundo o Datafolha. No mês passado, a aprovação de Bolsonaro caiu 13 pontos.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem sinalizado ser favorável à ampliação de benefícios sociais em paralelo à campanha de Bolsonaro. Guedes avalia criar um fundo para complementar o novo programa com a receita de privatizações
Apesar de agora apostar em um programa social para encorpar sua jornada rumo à reeleição em 2022, Bolsonaro já foi crítico ferrenho do Bolsa Família. Em 2010, durante campanha para deputado federal, chegou a se referir ao benefício como “compra de votos”.
FONTE É MAIS GOIÁS
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